Por Fernanda Valério Garcia da Silva
A Constituição Federal no art. 201, § 1º, assegura o direito a contagem de tempo diferenciada para fins de aposentadoria àqueles que exercerem atividades sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, o que resulta em um direito aposentadoria diferenciada, cada qual a depender da atividade especial desempenhada, designada aposentadoria especial. Referido dispositivo encontra-se regulamentado na Lei 8.213/1991, art. 57 e seguintes e no Dec. 3.048/1999, art. 64 e seguintes.
Ocorre que o § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991, acrescentado pela Lei 9.732, de 1998, veda a percepção de aposentadoria especial por parte do trabalhador que continuar exercendo a atividade especial.
Diz-se que não se trata cancelamento do benefício, mas sim suspensão, o qual volta a ser pago a partir do momento em que o segurado aposentado, que voltara a exercer atividades sujeito a condições nocivas à sua saúde, delas se desligue.
Importante destacar que no julgamento de Arguição de Inconstitucionalidade nº 5001401-77.2012.404.0000 o TRF da 4ª Região impôs o afastamento da norma restritiva com base nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, fundamentos constitucionais da República.
Na decisão proferida, julgou que referida restrição cerceia, sem que haja autorização constitucional para tanto (pois a constituição somente permite restrição relacionada à qualificação profissional), o desempenho de atividade profissional, e veda o acesso à previdência social ao segurado que implementou os requisitos estabelecidos na legislação de regência.
Segundo o TRF4, o disposto no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991 não possui caráter protetivo, pois não veda o trabalho especial, ou mesmo sua continuidade, impedindo apenas o pagamento da aposentadoria. Nada obsta que o segurado permaneça trabalhando em atividades que impliquem exposição a agentes nocivos sem requerer aposentadoria especial; ou que aguarde para se aposentar por tempo de contribuição, a fim de poder cumular o benefício com a remuneração da atividade, caso mantenha o vínculo; como nada impede que se aposentando sem a consideração do tempo especial, peça, quando do afastamento definitivo do trabalho, a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial.
Portanto, a regra não tem por escopo a proteção do trabalhador, ostentando mero caráter fiscal e cerceando de forma indevida o desempenho de atividade profissional. Inconstitucional, assim, referida, a qual, se adotada, pode implicar cerceamento ao desempenho de atividade, por exemplo, de profissionais de saúde (enfermeiros, técnicos em radiologia, médicos, dentistas, etc.), e trabalhadores especializados, seja de nível superior ou nível médio, de indústrias dos mais diversos ramos. Terão eles que escolher entre se aposentar ou deixar a atividade para a qual se prepararam, muitas vezes por longos anos ou, (burlando com facilidade a norma restritiva, mas perdendo a garantia que a lei e a Constituição asseguram), aguardar para requerer aposentadoria por tempo de contribuição sem se valer do tempo especial.
Desta forma, foi declarada, naquele caso concreto pelo TRF4, a inconstitucionalidade § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991 para que os segurados que percebam aposentadoria especial possam continuar a exercer a atividade que lhe garantiu a concessão do benefício, e sem a suspensão do seu pagamento.
Cabe destacar que referida hipótese pende de decisão definitiva pelo Supremo Tribunal Federal, o qual já declarou a repercussão geral[1] do tema no RE 788.092[2].
[1] Quando o tema extrapola os interesses subjetivos das partes, sendo relevante para toda a categoria de beneficiários do regime geral de previdência social.
[2] http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4506395.